terça-feira, 5 de junho de 2007

[Especial] A Destruição da Primeira Faculdade de Medicina do Brasil

"Atentai, ó vós que estais a pisar este chão.

Este chão é sagrado.

Este chão, este solo, esta terra são ungidos, são consagrados, são abençoados pelos deuses da Medicina.

Este é o chão do Santuário da Medicina primaz do Brasil."
A Sala dos Lentes - O templo dos Deuses da Medicina
A Faculdade de Medicina do Terreiro de Jesus um templo do saber médico e da ciência no Brasil. Ali, antes da expulsão dos jesuítas de Portugal e suas colônias, ficava o Colégio da Companhia de Jesus e nele, já transformado em Hospital Real Militar da Bahia, instalou-se por Decisão do Rei Dom João VI , em 18 de fevereiro de 1808 a Escola de Cirurgia da Bahia, primeira escola médica do Brasil. Em 1816 se transformaria na Academia Médico-Cirúrgica da Bahia para tornar-se, em 1832, a Faculdade de Medicina da Bahia, em 1891 a Faculdade de Medicina e Farmácia da Bahia, voltar a ser em 1901 a Faculdade de Medicina da Bahia e, no período da ditadura. quando as Universidades passaram a aglutinar as faculdades isoladas, tornou-se a Faculdade de Medicina da Universidade da Bahia, em 1946, até chegou a hospedar, em 1965, algumas dependências da Faculdade de Medicina da UFBa. Lugar de memória da medicina, do saber médico e do prestígio social dos médicos na sociedade brasileira, na sua arquitetura atual, resultado da reconstrução feita após o incêndio de 1905, emula, por um lado, os templos clássicos com suas inumeráveis colunas dóricas e jônicas e, por outro, as absides das igrejas cristãs na rotunda onde se instalou o anfiteatro. Seu mobiliário, seus ornamentos e os objetos que guarda permitem que o visitante vislumbre fragmentos do passado de glória do lugar que se vê e é visto como o berço da medicina no Brasil. Sua monumentalização no imaginário da cidade de Salvador e naquele dos cientistas do Brasil revestiram o velho prédio da função de lugar fundacional e de toda a carga simbólica que costuma a acompanhar esses espaços. Por isso é o Memorial da Medicina, sem uma especificação que o remeta à cidade de Salvador ou mesmo à Bahia: é, por excelência, o Memorial da Medicina no Brasil.
A rotunda do Anfiteatro
Antigos alunos e professores de medicina jamais absorveram a decisão do regime militar, que transferiu a faculdade do Terreiro de Jesus para o Vale do Canela. Eles acreditam que a partir daí o patrimônio cultural e intelectual do prédio começou a ir, literalmente, por água abaixo. "Não sabemos que motivação política impede a entrada de, ao menos, um centavo para a recuperação da antiga faculdade", comenta a bibliotecária Maria José Rabello. A presidente da comissão e da Academia de Medicina da Bahia, Maria Theresa de Medeiros Pacheco, diz que o sentimento é de indignação. "Estamos apelando para o presidente da República, para os ministros, as câmaras legislativas e os órgãos de classe. Precisamos da mobilização de todos para salvarmos este patrimônio", afirma Maria Theresa. A Comissão de Acompanhamento das Obras e Restauração da Faculdade de Medicina do Terreiro de Jesus se queixa da prioridade dada à reforma da ala nordeste, em detrimento aos outros ambientes da área de 12 mil metros quadrados. Os membros da comissão afirmam que não foram levados a sério pelos dirigentes da reconstrução. "Jamais nos ouviram", afirma Lamartine Lima.
A dor do descaso. A antiga biblioteca, entregue ao mofo e aos ratos. 200 anos de patrimônio, com dias contados para virarem pó. O médico luta para salvar sua paciente. Desenho de uma turma de formandos.
Mais grave ainda é a condição da biblioteca da faculdade do Terreiro. A história da biblioteca começa em 1836, vinte e oito anos depois da instalação da Faculdade de Medicina no Colégio dos Jesuítas. O acervo contava com documentos datados da vinda do imperador D. João VI ao Brasil tendo, portanto, uma grande importância histórica e inestimável valor cultural e científico. Durante este período, todas as coleções eram muito bem trabalhadas e conservadas. De 1876 até o início de 1905 a biblioteca viveu o seu apogeu. Entretanto, no carnaval de março de 1905 os foliões acompanharam o incêndio que consumiu parte do edifício da faculdade. Nesta ocasião, foram queimados 22 mil volumes dos quase 100 mil existentes. Reinaugurada em 1909 teve seu acervo recomposto com doações de toda a sociedade baiana. A derrocada da biblioteca começou com a transferência do campus do Terreiro de Jesus para o campus do Vale do Canela. Sem espaço disponível na nova sede, todo o acervo foi deixado para trás. Não apenas o abandono, como também as más condições estruturais do prédio do Terreiro de Jesus – construído em 1553 pelos Jesuítas – e a ação do tempo, contribuíram para a deteriorização de todo o acervo. O material encontra-se hoje em péssimas condições de conservação, com proliferação e mofo, ratos e insetos, que devoram dia após dia as memórias do templo da medicina. Teses de mestrado, doutorado, monografias, trabalhos publicados por professores e estudantes, livros raros... tudo isso sendo perdido por negligência dos responsáveis. Hoje acredita-se que 50% dos 160 mil títulos estão perdidos. O descaso do governo federal para com o patrimônio que constitui a Faculdade de Medicina do Terreiro de Jesus é flagrante.
Livros e documentos históricos em péssimo estado de conservação A água das chuvas, quase diárias em Salvador, escorre por entre papéis bicentenários
A situação é crítica. Pisos e tetos nos vários ambientes da construção de 400 anos correm o risco de desabamento. Não dá pra entender por que, na reforma, foi priorizada a ala nordeste do prédio, com a reconstrução do Anfiteatro Alfredo Britto, enquanto o pavilhão da biblioteca de 160 mil livros, o salão nobre, as salas da congregação e dos lentes e o Memorial da Medicina Brasileira ficam à toa. A verdade é que a administração da UFBa atual têm o desejo de transformar todo o Terreiro em um complexo empresarial-turísticos para convenções de alto-nível, daí estar se fazendo de tudo para destruir até o último fio de dignidade do Terreiro. Não pensem que isso é mentira, apenas procurem saber o que é um tal de um projeto chamado Universidade Livre. Esse projeto visa a aplicação de 1,5 Milhão de reais, que teoricamente deveriam ser investidos na restauração do Terreiro, na transformação dele num grande e caro centro de convenções na área turística mais nobre da cidade de Salvador, agradando à iniciativa privada e a outros interesses obscuros. O que você quer fazer para salvar a primeira instituição de ensino superior do Brasil, a primeira faculdade de Medicina no Brasil, o Templo dos Deuses da Medicina, a Faculdade de Medicina do Terreiro de Jesus?
Pode começar protestando. Mande um e-mail para o reitor! gabinete@ufba.br

Nenhum comentário:

Obrigado pela visita!

 
eXTReMe Tracker